A miscigenação do mundo é inevitável

Não há como indefinidamente impedir as revoluções sociais e raciais

Fonte: Livro "Crônicas & Entrevistas", de 2000. | Atualizado em dezembro de 2022.

A inevitável miscigenação humana constitui-se num fato de proporções globais. Vários estudiosos afirmam que, cada vez mais, diminui no planeta o conceito de raça pura. Um exemplo dessa constatação vem dos Estados Unidos, que criaram um item no seu censo para contemplar os mestiços que compõem significativa parcela da população norte-americana. Por isso, a pergunta que lancei no artigo “O Abolicionista Divino”, na página 149 de meu livro Crônicas & Entrevistas. Desde a monera, quem não é miscigenado neste mundo? Aqui no Brasil, essa realidade não é outra: a Folha de S.Paulo publicou, em abril de 2000, o resultado de pesquisas feitas a partir do DNA, abrangendo 200 homens e mulheres brancos, de diferentes regiões e origens. O estudo concluiu que, num grupo de 100 pessoas brancas, somente 39 têm exclusiva linhagem europeia. Os demais indivíduos carregam a marca da miscigenação: 33% de indígenas e 28% de africanos.

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Mesmo a Europa teve, em várias ocasiões de sua história, toda ordem de imigrantes, escravos e invasores a exemplo dos hunos, povo da Ásia Central, que invadiu o continente sob a liderança de Átila, em meados do Século V, infligindo graves derrotas e submetendo a tributo os imperadores de Roma e de Constantinopla, além de devastar a Gália e atravessar a Germânia, região onde surgiria, séculos depois, Hitler (1889-1945), que, com base na falsa ideia de raça ariana pura, chacinou milhões de judeus, ciganos, eslavos e pessoas com deficiência. Teriam ficado os invasores dos territórios germânicos em estado permanente de castidade? Ou deixaram lá a marca étnica em decorrência do cruzamento inter-racial, após tantos séculos diluído? Lembremo-nos da famosa “mancha mongólica”.

Não há como indefinidamente impedir as revoluções sociais e raciais

Vai ficar difícil abrir mão da humanidade, como parece que alguns radicalmente pretendiam fazer com a nova globalização: mais produtos e menos operários produzindo.

Marcante exemplo é o da União Europeia, com seus arroubos de xenofobia, menos para turistas... Ela está constatando a contingência de ter de “importar” gente, ainda que, em certos casos, por curtos períodos, para realizar serviços de que os seus nativos dolicocéfalos não mais querem saber e para suprir as necessidades de uma população que está envelhecendo. Alguns já vivem arrepiados com os “perigos” da mistura étnica. Contudo, empresários e políticos já sentem como fatalidade histórica a presença dos “estrangeiros”, principalmente os de pele diversa.

Não há como indefinidamente impedir que revoluções sociais e raciais dessa grandeza se realizem.

Na atualidade, de certa forma vemos repetir-se, em direção inversa, mas talvez de maneira mais dolorosa, o fenômeno da imigração. Antes a onda era da Europa e da Ásia para a América. Resumindo: italianos, japoneses, alemães, judeus, árabes, ibéricos, para a do Norte e a do Sul, somando-se irlandeses e chineses para a Setentrional. E não desembarcaram aqui e lá, na imensa maioria, como senhores, porém como servidores braçais. Pelo sacrifício e suado labor, subiram ao topo.

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Augusto Comte

Recordo-me de uma afirmação do filósofo do Positivismo, Augusto Comte (1798-1857), cujo pensamento tanta influência exerceu sobre os fundadores da República Brasileira, a começar por Benjamin Constant (1836-1891): “O homem se agita e a humanidade o conduz”. É isso aí.

Ufa!

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Benjamin Constant

Hoje, os imigrantes, legais ou não, também largam seus países, deixando tradições e amores para trás, por necessidade premente. No caso norte-americano, prossegue a chegada ininterrupta, superando as barreiras que lhes são antepostas, de “hispânicos”, em grande quantidade mexicanos, que, com o passar do tempo, estão criando status. Milhões já podem votar. E o número não é pequeno, e não cessa de crescer, até mesmo por força de sua alta taxa de natalidade. Há, igualmente, a presença dos cubanos, em Miami. Tornaram-se, por lá, uma força ponderável. Em Nova York, conforme as notícias divulgadas em 2000, 40% de seus habitantes vieram de 167 países e falam 116 idiomas. Ufa! Realmente, o criador do Comtismo estava certo.

“O mundo irá misturar-se como um oceano”

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Conde de Cavour

Durante uma fase de minha infância, estudei no Colégio São Francisco de Sales, da ordem de Dom Bosco. Todavia, o tempo foi bastante para tornar-me um dos muitos admiradores do respeitado educador de Turim. Erigiu uma pedagogia com louvável benefício para os seus birichini, jovens largados na vida em uma Itália pobre, que se unificava sob a batuta da astúcia diplomática (será redundância?) do Conde de Cavour (1810-1861), da pertinácia de Mazzini (1805-1872), do espírito aguerrido de Garibaldi (1807-1882).

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Giuseppe Mazzini

Dizia o célebre taumaturgo nascido em Becchi: “Um grandioso acontecimento se está preparando no céu para fazer pasmar as gentes. (...) Far-se-á uma grande reforma entre todas as nações, e o mundo irá misturar-se como um oceano”.

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Garibaldi

Para os que me leram até aqui, porventura com um sorriso de condescendência, exponho este alertamento de Cícero (106-43 a.C.), orador e político romano, a respeito de que nem as comunidades mais requintadas e cultas desprezam o dom da profecia. Além disso, no campo laico, economistas fazem previsões que nem se concretizam, analistas vaticinam reações da sociedade e muitas vezes se equivocam. E, se entrarmos no campo do esporte, então...

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Dom Bosco 

Aliás, observando o mundo, não fica difícil concluir que Dom Bosco (1815-1888) estava acertadamente antevendo os tempos que vivemos.

O Brasil é uma grei globalizante

Volvendo os olhos para o nosso país, repleto de descendentes de imigrantes e, também, de migrantes esperançosos de que finalmente sejam integrados no melhor do seu tecido social, confirma-se a evidência de que possui um dos mais extraordinários povos do orbe, e com características privilegiadas, em virtude de sua formidável miscigenação. Ele é uma grei... globalizante...

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Pietro Ubaldi

Pietro Ubaldi (1886-1972), filósofo e sociólogo italiano, aqui chegado no princípio da década de 1950, soube ver o que outros começam a perceber agora: “O Brasil é a terra clássica da fusão de raças, é o melting pot em que tudo se mistura. E sabemos que a natureza se regenera na fusão de tipos diversos, ao passo que o princípio racista isolacionista é antivital”. (...)

Apesar da inópia à espera de ser definitivamente exorcizada, na Terra de Santa Cruz subsiste a grandeza que lhe tem permitido manter o milagre na sua unidade geográfica, idiomática e expresso na capacidade de sobreviver.

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Leibniz

Ah! A extrema violência de hoje?! Será que a culpa é do povo ou da senzala que não foi de todo desmontada? É da globalização? Antes foi do quê? Com a palavra, o matemático germânico Leibniz (1646-1716): “Sempre tive por certo que, se reformássemos a educação da mocidade, conseguiríamos modificar a linhagem humana”.

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Montaigne

Mas em que bases? Hitler também queria alterá-la... O escritor francês Montaigne (1533-1592) nos oferece a resposta: “Cuidamos apenas de encher a memória e deixamos vazios o entendimento e a consciência”.

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Gilberto Freyre

Isto é, além de instruir, urge ecumenicamente espiritualizar a grei globalizante, que singulariza um caminho novo para o mundo. Quem viver verá! O sociólogo Gilberto Freyre (1900-1987) proclamava que “o Brasil precisa descobrir o Brasil”.

José de Paiva Netto, escritor, jornalista, radialista, compositor e poeta. É presidente da Legião da Boa Vontade (LBV). Membro efetivo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Associação Brasileira de Imprensa Internacional (ABI-Inter), é filiado à Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), à International Federation of Journalists (IFJ), ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro e à União Brasileira de Compositores (UBC). Integra também a Academia de Letras do Brasil Central. É autor de referência internacional na defesa dos direitos humanos e na conceituação da causa da Cidadania e da Espiritualidade Ecumênicas, que, segundo ele, constituem “o berço dos mais generosos valores que nascem da Alma, a morada das emoções e do raciocínio iluminado pela intuição, a ambiência que abrange tudo o que transcende ao campo comum da matéria e provém da sensibilidade humana sublimada, a exemplo da Verdade, da Justiça, da Misericórdia, da Ética, da Honestidade, da Generosidade, do Amor Fraterno. Em suma, a constante matemática que harmoniza a equação da existência espiritual, moral, mental e humana. Ora, sem esse saber de que existimos em dois planos, portanto não unicamente no físico, fica difícil alcançarmos a Sociedade realmente Solidária Altruística Ecumênica, porque continuaremos a ignorar que o conhecimento da Espiritualidade Superior eleva o caráter das criaturas e, por conseguinte, o direciona à construção da Cidadania Planetária”.