Portugal é uma Paixão

Fonte: Artigo escrito por Paiva Netto, durante visita missionária à cidade de Lisboa, em abril de 1993. | Atualizado em maio de 2022.

Por ocasião da Semana Santa, estando em visita à capital desse belo país, procurei expressar em palavras, como se fora possível, a satisfação da minha Alma em ver o ideal da Boa Vontade de Deus ser acolhido pelo seu povo:

Amanhece. Os pássaros trazem, timidamente ainda, ao nosso ouvido, o seu canto enternecedor. Contemplo Lisboa adormecida. Languidamente se espreguiça. Como é linda! Ainda não acordou de todo. Lá longe, à direita, mais ao alto, brilha o castelo de São Jorge. A meio caminho corre, arborizada, a Liberdade. Ainda à destra, bem mais perto que a iluminada fortaleza, sobranceiro, surge Pombal. Aumentam as viaturas ligeiras e autocarros que circulam à sua volta. Mas os peões tardarão um pouco. Um ou outro transita, fugidio, lá em baixo, distante. Apenas amanhece, pelo menos para as gárrulas avezinhas que carregam as árvores urbanas dos sons da existência rural. São um exemplo: resistem à poluição. As suas gargantas sobrevivem aos gases tóxicos. E elas cantam. E enquanto o fizerem será eterna a Esperança.

François Philipp

Castelo de São Jorge

Ontem cheguei do Norte. De lá conheço bem a cativante Ribeira. Da Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia, absorvo toda a sua intensa poesia. A Torre dos Clérigos os olhos embeleza. Na Avenida dos Aliados, sinto o pulsar enérgico do coração do Porto. Vim da região minhota, onde estou a viver dias profícuos. Braga, Vila Nova de Famalicão, Guimarães... Gente muito acolhedora também.

Toda a estrada, e são uns bons quilômetros, mirei a vida.

Aqui há uma grande reserva de humanidade. E isso, humanidade, lembra Jesus. Estamos na Semana Santa. Bem que, para mim, todas sejam santas, porque durante elas vivem e amam as sagradas criaturas de Deus. Esse é o desejo de qualquer bom cristão, assim como Alziro Zarur, António de Lisboa, a Rainha Santa, Dom Bosco, Francisco de Assis, Alberto Schweitzer, Einstein, Gandhi e tantos quantos que, declaradamente ou não, sob a bandeira do Amor, que é a do Cristo, teimosamente passaram, ou estão a passar, por este mundo, com maioria de atos que beneficiam os seres espirituais e terrenos. Ser cristão não é carregar um rótulo, muitas vezes hereditário, todavia um estado natural de civilidade, uma forma quintessenciada de bem-querer, que não é privilégio de crença, ideologia, etnia, ou o que mais persista em separar os homens, dando razão àquela advertência do famoso Mahatma, bramanista por nascença, mas que carregava consigo, por considerar a maior página jamais escrita, as Bem-Aventuranças do Sermão da Montanha, de Jesus (Evangelho, segundo Mateus, 5:1 a 12). Dizia o Gandhi (1869-1948): “Olho por olho, e a humanidade ficará cega”. E nós completamos: com guerra quente ou guerra fria...

Até entre ateus podemos encontrar bons cristãos. Não foi sem motivo, pois, esta meditação de Alexandre Herculano (1810-1877), que resumimos: “A Fraternidade é a essência do Cristianismo”.

Reprodução BV

Fernando Pessoa

Acredito em Portugal. Acredito. Não se mede um país pela sua extensão de terras nem pela quantidade de seu povo.

Há alguns anos, escrevendo para um periódico luso, grafei as seguintes palavras: (...) Portugal que, em dado momento da História, alargou as fronteiras pela Terra, tem latente dentro de si todo aquele tesouro de Fé e de Esperança, sintetizadas na grandeza destes versos de Fernando Pessoa (1888-1935) em:

Prece

Senhor, a noite veio e a Alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

 

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

 

Dá o sopro, a aragem — ou desgraça ou ânsia —,
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distância —
Do mar ou outra, mas que seja nossa!

Realmente, meu caro Pessoa, “tudo vale a pena, se a Alma não é pequena”. O mar, hoje, são todos os povos da Terra à espera da mensagem de libertação da escravatura mental, que desgraça a humanidade. E como é grande e viva a Alma de Portugal. (...) Muito há que se falar sobre o assunto, porque imensamente ricos são os laços que unem duas pátrias historicamente irmãs, na construção do futuro, na grande tarefa de renovação espiritual do mundo: Portugal e Brasil.

José de Paiva Netto, escritor, jornalista, radialista, compositor e poeta. É presidente da Legião da Boa Vontade (LBV). Membro efetivo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Associação Brasileira de Imprensa Internacional (ABI-Inter), é filiado à Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), à International Federation of Journalists (IFJ), ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro e à União Brasileira de Compositores (UBC). Integra também a Academia de Letras do Brasil Central. É autor de referência internacional na defesa dos direitos humanos e na conceituação da causa da Cidadania e da Espiritualidade Ecumênicas, que, segundo ele, constituem “o berço dos mais generosos valores que nascem da Alma, a morada das emoções e do raciocínio iluminado pela intuição, a ambiência que abrange tudo o que transcende ao campo comum da matéria e provém da sensibilidade humana sublimada, a exemplo da Verdade, da Justiça, da Misericórdia, da Ética, da Honestidade, da Generosidade, do Amor Fraterno. Em suma, a constante matemática que harmoniza a equação da existência espiritual, moral, mental e humana. Ora, sem esse saber de que existimos em dois planos, portanto não unicamente no físico, fica difícil alcançarmos a Sociedade realmente Solidária Altruística Ecumênica, porque continuaremos a ignorar que o conhecimento da Espiritualidade Superior eleva o caráter das criaturas e, por conseguinte, o direciona à construção da Cidadania Planetária”.