Les Misérables ontem e hoje
Quanto ainda precisamos aprender neste mundo! Sem falar do que necessitamos compreender a respeito do Outro, o Invisível.
Quando Jesus diz: “A cada um de acordo com as suas obras” — não está determinando a punição aleatória de ninguém porque Ele resolveu que deveria ser assim... É que, se não houver esse conceito do Mestre em evidência, algo cresce muito: a impunidade com todos os seus corolários. Suas resultantes tantas vezes trágicas representam um reino da falta de vergonha, em que se prende quem rouba um pão, como em Les Misérables, de Victor Hugo (1802-1885), e se deixa cinicamente livre aquele que assalta a pátria. Estes levam à miséria e ao desespero multidões. Elas, por terem sido mantidas incultas e mal informadas, demoram a entender o dano que lhes é feito por quem as deveria favorecer. Por isso, não basta instruir, é urgente espiritualizar. Quem, na realidade, eleva o Espírito precata-se de se valer do seu conhecimento como se fora um assaltante de beira de estrada.
O Evangelho de Jesus sobrevive porquanto expande uma forte mensagem espiritual, moral (eu não disse moralista), ética, humana, social. Ao estudá-lo, em Espírito e Verdade, à luz do Novo Mandamento do Cristo Ecumênico, o Divino Estadista, portanto, Planetário, passamos a assimilar — com o fluir do tempo, que “é o grande Ministro de Deus”*1 — o conceito de Justiça aliado à Bondade, jamais na conivência com o mal. A questão é não nos transformar em cúmplices do que está errado, mas incorporar à Alma essa elevada aliança com o sentimento de benevolência que nasce do coração humano, criado por um Deus que, na definição de Jesus por intermédio de João Evangelista, é Amor. No desejo de tornar mais claro o raciocínio, digo-lhes que sempre me alinhei a Confúcio (551-479 a.C.) quando afirma, do alto de sua sabedoria milenar, que “paga-se a Bondade com a Bondade, mas o mal com a Justiça”.
Prosseguindo sobre assunto tão vital, há muitos anos, numa pregação de improviso que proferi no Rio de Janeiro/RJ, declarei que a Justiça de Deus é a expressão verdadeira do Amor. Vejam que eu disse de Deus, não de qualquer criatura que Nele se arvore, atrevendo-se a sentar no Seu Trono e decidir sobre a vida humana como se Ele próprio fosse. A advertência de Jesus, o Profeta Divino, em Seu Evangelho, consoante Marcos, 13:21 a 23, no capítulo que anuncia a Grande Tribulação de que temos falado nesta publicação, é clara:
“21 Então, se alguém vos disser: Eis aqui o Cristo! Ou: Ei-lo ali! Não acrediteis;
“22 pois surgirão falsos cristos e falsos profetas, operando sinais e prodígios, para enganar, se possível, os próprios eleitos.
“23 Estais vós de sobreaviso; tudo vos tenho predito”.
(...) O amadurecimento ir-nos-á revelando essa Augusta Face do Pai Celestial, a qualidade pedagógica do Seu Amor e de Sua Justiça. O Espírito Auta de Souza (1876-1901) mostra-nos um caminho para decifrar esse mecanismo universal pelo que Deus transforma devedores de Sua Lei em notáveis agentes dela:
"Contrastes
Auta de Souza (Espírito), na psicografia de Chico Xavier (1910-2002).
"Existe tanta dor desconhecida
"Ferindo as almas pelo mundo em fora,
"Tanto amargor de espírito que chora
"Em cansaços nas lutas pela vida;
"E há também os reflexos da aurora
"De ventura, que torna a alma florida,
"A alegria fulgente e estremecida,
"Aureolada de luz confortadora.
"Há, porém, tanta dor em demasia,
"Sobrepujando instantes de alegria,
"Tal desalento e tantas desventuras,
"Que o coração dormente, a pleno gozo,
"Deve fugir das horas de repouso,
"Minorando as alheias amarguras".
(O destaque é meu.)
Anotaram bem? Eis o caminho da Política de Deus: faça a criatura entender o Mecanismo de Salvação do Seu Criador, que conclama
“(ao) coração dormente, a pleno gozo,
“(...) fugir das horas de repouso,
“Minorando as alheias amarguras”.
E por falar nesse sublime sentir e agir, lembremo-nos continuamente do Mandamento Novo do Divino Chefe, constante de Seu Evangelho, segundo João, 13:34 e 35; 15:13 e 9: “Novo Mandamento vos dou: amai-vos como Eu vos amei. Somente assim podereis ser reconhecidos como meus discípulos, se tiverdes o mesmo Amor uns pelos outros. (...) Não há maior Amor do que doar a própria vida pelos seus amigos. (...) Porquanto, da mesma forma como o Pai me ama, Eu também vos amo. Permanecei no meu Amor”.
Alziro Zarur (1914-1979), saudoso fundador da Legião da Boa Vontade — que definiu essa notável Lei do Cristo como “a Essência de Deus” —, muito acertadamente completava: “E Jesus deu a Sua existência até por aqueles que se consideravam Seus adversários”.
Ninguém está condenado eternamente
Excelente a conclusão do sempre lembrado escritor de Poemas da Era Atômica. (...) À medida que o tempo vai transcorrendo, por meio das vidas sucessivas, todos vão entendendo e vivenciando, pela Dor ou pelo Amor, as lições libertadoras do Pedagogo Celeste, por força de Suas palavras e de Seus exemplos.
Oportuna é a palavra esclarecedora do Irmão Clarêncio em construtivo diálogo com Hilário, na obra Entre a Terra e o Céu, de André Luiz (Espírito)*2: “Todos nos achamos na grande marcha de crescimento para a imortalidade. Nas linhas infinitas do instinto, da inteligência, da razão e da sublimação, permanecemos todos vinculados à lei do renascimento como inalienável condição de progresso. Atacamos experiências múltiplas e recapitulamo-las, tantas vezes quantas se fizerem necessárias, na grande jornada para Deus”.
Ninguém está condenado à danação eterna, senão o demônio seria bem mais poderoso que Deus, e a Criação Divina seria uma satânica comédia, com licença do Alighieri (1265-1321) (...).
Notas do autor
*1 “O tempo é o grande Ministro de Deus”, pensamento muitas vezes citado por Alziro Zarur.
*2 Psicografia de Chico Xavier.
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